quarta-feira, 13 de abril de 2016

A Criança e O Projeto de Nação (ensaio)



Rafael dos Santos Borges 

I O Problema:

Nem sei dizer a essas crianças se ainda há nação, tampouco se há razão para termos uma nação. Contudo, se faz necessário dizer a essas crianças que não há razão para o ódio, o desespero, a mágoa e a competição. Estamos numa escola caduca, que guarda uma modernidade igualmente velha, em que até sua arquitetura, já foi denunciada por estruturalista, sobre tudo Foucault, como aniquiladora ou conformadora de indivíduos ao trabalho, ao Estado e às instituições totais.  Porém, estamos na escola e não há melhor lugar para estarmos, se quisermos romper com as caduquices da modernidade, precisamos estar com os mais jovens.

II A família:

Antes, ou, em tempos recentes de modernidade as famílias partilhavam com o Estado, ou apenas buscavam nele a complementação para educação dos seus filhos, os quais falavam de instrução, aprender, estudar, hoje as famílias confiam seus filhos às escolas a guarda de seus filhos, pois as demandas da sociedade pós-moderna (que também gosto de chamar de capitalista triunfante), dá ao indivíduo papéis múltiplos e que se concorrem, veja: a mulher, trabalha, estuda e é mãe; o homem trabalha, estuda, e é pai;  numa configuração que não os obriga a ser marido, esposa, mas se há filhos, são obrigatoriamente pais; e, as crianças, são filhos, de forma inerente, frágeis.
Não me arrisco em dizer que não há mais famílias, mas hoje elas são menores, menos solidárias (internamente, pais, mães e filhos, competem, Renato Russo, poeticamente cantou “você culpa seus pais por tudo, isso é um absurdo, são crianças como vocês”), mais solitárias, não há laços familiares mais ampliados na mesma geração ou situação etária (como tios, primos, cunhados). Mesmo o sentido semântico de família, oriundo do latim “familus” , que pode sem entendido como criado, servo, obediente, não nos cabe mais, a obediência parece ser um valor obsoleto (os adultos são desobedientes, por exemplo, não pedem nota fiscal, para driblar os impostos).
A mudança de paradigma familiar atinge as duas classes sociais mais frágeis: a classe média, que absorve os valores da classe alta, os adultos lançam-se em busca de signos de status e riqueza e acabam, num padrão de exigência de consumo, endividando-se e severamente alienados, não mais donos do próprio tempo, trabalham mais e mais, endividam-se mais e mais e assim, entram mais e mais nesse ciclo perpétuo que os afastam fisicamente dos filhos (por exemplo, matriculam o filho em uma escola bem cara para o manter ocupado, além de manterem-se num grau de prestígio e status cultural elevado, para isso lançam-se em mais projetos de trabalho que os afastam dos filhos); já aos pobres, a pobreza sempre presente, os faz igualmente se alienarem da educação dos próprios filhos, trabalham mais e mais, não acumulam riqueza, endividam-se para dar em conforto o que falta de tempo e atenção aos filhos, recorrem à escola pública, na qual confia a guarda dos filhos, porém,  essa lhes parece apenas um privilégio, não um direito, pois escola pública para pobres é recente, ao menos no Brasil, filhos de pobres, frequentam uma escola pública empobrecida em recursos e organização, contribuindo para herança maldita de um capital cultural desprivilegiado, contudo, a escola pública cuida, dá merenda, dá uniforme, dá material e  dá leite.
As discussões sobre sexualidade, não deveriam ser confundida com a discussão sobre família, esse tipo de organização social, tem como valor fundamental o afeto a proteção aos membros do seu grupo, em especial, velhos, crianças e doentes. Apenas por isso, qualquer instituição família que proteja vale ser defendida.

II O Estado:

Os Estado-Nação-Território como os conhecemos hoje foi configurado ao nascer do capitalismo, durante a modernidade, desde o príncipe maquiavélico, até a unificação de Portugal, um Estado forte protegia os interesses de uma burguesia ascendente, com os valores morais do lucro, do trabalho e das riquezas em ascensão. Tal configuração estatal já nascia com contradições e propostas de antagonismo, com o socialismo utópico de Thomas Morus , até chegarmos ao socialismo científico e, por fim, soviético. Agora, nesse triunfo do capitalismo, ainda que nos reste uma utópica Cuba, o socialismo, não vingou, veio a hegemonia do capitalismo suavizada com o verbete Globalização.
Para as empresas, ou para os fluxos globais do capital, não há restrição de território, as leis estatais que protegem os Estados-Nação são facilmente negociadas por meio de políticos desprestigiados, vazios de referência ideológicas, facilmente comprados, que trazem si  o poder de manipular leis em favor de interesses empresarias e especulativos.  No nosso tempo a configuração Estado-Nação-Território vive um interregno. Não são os partidos que são questionáveis, mas o próprio Estado e a Nação. Por isso ficam as dúvida: E os jovens que nascem nesse território? Sem escola, sem família, sem Estado? Parece que o fim do Estado, nesses tristes trópicos se reconfigura como periferização, até aqui vinte anos, restará aqui os que não puderam ir para Europa e os velhos.
Contudo, um projeto grande, de Estado- Nação poderosa incorre o risco de aniquilar a criança, o sujeito, seus sentimentos e projetos de ser. Ao mesmo tempo em que o individualismo exacerbado em práticas liberais triunfantes, aniquila a criança, o sujeito ao abandonar na competição egoísta e na existência pelo consumo. Em qualquer situação as crianças são os sujeitos frágeis.  Do pensamento clássico, se tem que: “qualquer descuido com a educação é um descuido grave para a Pólis”, por Aristóteles, que em a Politica, Ética a Nicômaco, pressupunha que a formação do indivíduo era para Pólis, mas depois de cultivada a sua areté. Buscava-se o equilíbrio entre o indivíduo para a Pólis e a Pólis para o indivíduo.
Dentre as instituições criadas na modernidade sobreviveu forte a escola, que hoje serve para proteger, cuidar e preservar os mais jovens; para os apresentarmos ao mundo velho; fazer-lhes promessas de um mundo novo, e; dizer que muita coisa já é sabida, mas que há outros mistérios por desvendarmos.

III- A ética          

Da mesma maneira buscamos um referencial sobre ética e política em tempos e modernidade exacerbada ou tardia, posto que tal modernidade trouxe-nos horrores como as Guerras Mundiais e as lutas posteriores no contexto da Guerra-fria, o racionalismo científico, construído em projetos modernos e positivistas de escola que não redundou em crianças felizes nem em adultos satisfeitos.
Maria Rita keel (2002) recorre aos “Direitos Humanos” conclamados em 1948. Disso sobre valores, subjetividade, política e educação e lista dentre os artigos aqueles considera útil explanar para tratar de subjetividade, politica e direitos humanos, segue alguns tópicos e reflexões para a construção de uma escola ética e reflexiva que leve em conta os valores morais , num código originário de valores mínimos:
 - A dignidade humana é imprescindível para completar nossa existência e que incluí à todos na escola, de maneira igual, em princípio e direito;
- O espírito de fraternidade, pois só nos é possível viver em coletividade;
- Gozar de liberdade plena, pois a partir de bases mínimas, que são os os direitos humanos, se pode fazer algo, usufruir de seus direitos é saber fazer, saber o que fazer, ser capaz de fazer;
- Direito de ser em todos os lugares, guardando o respeito que sua liberdade é sempre acompanhada por liberdade do grupo, o indivíduo não precisa se oprimir para viver;
- Nós humanos somos mortais, nossa linguagem nos da uma condição imortal, mas nós só existimos na pluralidade, nossas obras devem levar em consideração a pluralidade da vida planetária e viabilidade para a continuidade da vida, pois todos os homens tem deveres para comunidade.
 Assim,  a escola busca ser um ambiente  feliz, que não oprima, formate e persiga;
A escola de todas as instituições que passam por crises profundas de existência, talvez, seja a que mais reflita sobre si, uma outra escola é possível, uma escola que atenda as demandas libertadoras, de busca da igualdade, do lugar da curiosidade e das inovações. Pode ser por isso, que as demandas sobre a escola aumentam, pois das instituições da modernidade ela tem se mostrado a mais sólida e confiável, do que o Estado, o Mercado e menos fragilizadas do que as famílias.

Referências bibliográficas:

ARISTÓTELES, Anon. política. In: Política. Martin Claret, 2001.

KEHL, Maria Rita. Subjetividade, Política e Direitos Humanos. In. SILVA, Marcus Vinícius de Oliveira. Psicologia e direitos humanos: subjetividade e exclusão. São Paulo: Casa do Psicólogo, 2004. Disponível em: <https://books.google.com.br/books?id=7b3apxuJWM8C&lpg=PA34&dq=Maria%20Rita%20Kehl%3A%20condi%C3%A7%C3%A3o%20humana&hl=pt-BR&pg=PA30#v=onepage&q=Maria%20Rita%20Kehl%3A%20condi%C3%A7%C3%A3o%20humana&f=false>  Acesso em 13/04/2015;


MARTÍNEZ, José Luis Calvo et al. Ética a Nicómaco. Alianza Editorial, 2001.